quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Faces da tragédia urbana


 


Aconteceu em Mogi das Cruzes neste mês de setembro de 2013, mas poderia ter ocorrido em qualquer cidade do Brasil. Dois motoristas se perseguem numa avenida à noite. Batem. Um dos carros desgovernado invade a calçada, atropela oito jovens, dos quais seis morrem. Esse motorista é preso, o outro foge. Fatalidade? Irresponsabilidade?

Detalhes surgem apenas nesses acidentes com grande impacto emocional. Não culpo a imprensa, pois não é função da mídia reformar o país.

O motorista atropelador é pedreiro e dirigia um Monza. Preconceito meu? Não. Irresponsabilidades desse tipo são mais comuns nas classes mais altas. 

Esse motorista tinha sua CNH vencida há vinte anos. Alguém duvida que durante todos esses anos ele se absteve de dirigir quando teve oportunidade, em função de não estar legalmente habilitado? 

Conheci dezenas de casos semelhantes. Parentes, amigos, conhecidos, nenhum admitiu ter parado de dirigir por estar em condição ilegal. CNH vencida, CNH recolhida por excesso de pontos, documentação do veículo irregular, o que seja. O máximo que fazem é tomar um pouco mais de cuidado, o que geralmente significa evitar pegar estradas onde haja fiscalização com polícia rodoviária.  

Um repórter me pergunta se conheço qual é a fração de motoristas com CNH vencida ou recolhida que continua dirigindo. Minha resposta: sim, conheço, todos. “Mas a porcentagem?” Provavelmente 100%. “Há como comprovar?” Sim, mediante pesquisas de campo. “Elas existem?” Não. “Qual a razão desse comportamento? É a [má] índole do brasileiro?”

Não, absolutamente NÃO. Já disse e repito, o brasileiro não é pior nem melhor do que outros povos. A ÚNICA RAZÃO PARA ESSE DESCALABRO É A TOTAL E COMPLETA FALTA DE POLICIAMENTO DE TRÂNSITO NAS RUAS DAS CIDADES BRASILEIRAS. DISSE POLICIAMENTO E NÃO FISCALIZAÇÃO À DISTÂNCIA.

Em 25 de abril publiquei uma postagem, da qual reproduzo trecho em azul:

 
Como enfatizei diversas vezes, o maior problema de nosso “Sistema Nacional de Trânsito” é a inexistência na prática da verdadeira AUTORIDADE policial fiscalizando permanentemente o transito de modo amplo, contínuo e severo. Nas estradas há algum policiamento, mas muito longe do mínimo necessário para que possa ser realmente eficaz, por falta de efetivo, equipamentos e métodos de ação modernos (fora os entraves legais para uma ação policial mais contundente).

Daí vem a maior parte da sensação de impunidade que aquela fração de motoristas relapsos, displicentes, agressivos, afoitos, delinquentes e os que “não querem passar por trouxas” (agindo, portanto, do mesmo modo que os outros) têm. Na verdade creio que o problema é ainda pior. Sensação de impunidade subentende uma percepção consciente: “posso fazer o que bem entender porque ninguém vai me impedir, portanto faço e continuarei fazendo todas as barbaridades que quiser”. A impunidade no trânsito tem sido tamanha no Brasil, ao longo de tanto tempo, que se estabeleceu no subconsciente das pessoas. O futuro nos cobrará um alto preço por isso.

A outra parte vem do sistema legal - jurídico estupidamente leniente, traço praticamente incurável da cultura brasileira. Quase todas as semanas em algum lugar do Brasil alguém bêbado (às vezes sem habilitação), invade calçadas ou pontos de ônibus, atropelando, ferindo e matando pessoas. Levado à delegacia (onde se comprova a embriagues) paga R$ 1.500,00 de fiança e sai para responder processo por crime culposo em liberdade. No dia seguinte está dirigindo de novo. As autoridades fazem de conta que “com a carteira cassada” o trabalho está feito, o cidadão não vai mais pegar no volante. Pois sim...

 

Só nos resta esperar a próxima tragédia... e a próxima... e a próxima... e a próxima... e a próxima... e a próxima...

 

02 de outubro de 2013

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