Volto ao tema (i)mobilidade urbana.
Dos jornais brasileiros de grande
circulação que consulto quase diariamente, o “Estadão” é o que mais tem se
dedicado ao assunto trânsito, seja em segurança ou em mobilidade. Infelizmente,
como comentei em mais e uma ocasião, essas opiniões não são suficientes para
sacudir a sociedade ao ponto de motivar transformações essenciais rapidamente.
Aliás, desconfio que alguém da
redação do Estadão tem lido secretamente meus posts... Invariavelmente as
opiniões expressas coincidem com pontos que coloquei em postagens anteriores, he, he...
O título deste post consta do texto
de recente Editorial do Estadão “A Cidade dá o Troco” (ou se vinga?).
Sobre a imobilidade urbana escrevi
cerca de nove posts nos últimos meses, apontando vícios de executivos e
legislativos em geral. Com relação ao último Editorial do Estadão há alguns
pontos de coincidência interessantes.
Editorial de 03 de dezembro de 2013
(em vermelho)
São Paulo está lhe dando [prefeito Hadad] o troco por outra
barbeiragem pela qual não só não dá o braço a torcer, como ainda promete
agravar. O desastre continuado é a crise do já terrível trânsito na cidade
devido à combinação de populismo e de interesses privados que o levou a criar
com uma simples demão de tinta faixas exclusivas para ônibus na pista da
direita das vias escolhidas. O prefeito, já agraciado pelos paulistanos com o
apelido "Fernando Maldade", faz jus, cumulativamente, ao de
"Fernando Travando", tais os congestionamentos bem acima de 100
quilômetros que tem provocado, já pela manhã e em locais muito menos sujeitos a
tais suplícios nos períodos fora de pico. Apoiado, se não instigado, por seu
secretário de Transportes, o empresário petista Jilmar Tatto, de afamada
família, Haddad empurrou para o último círculo do inferno da mobilidade urbana
a legião dos que recorrem ao automóvel particular, para o seu ir e vir, e os
taxistas proibidos de apanhar ou deixar passageiros salvo em áreas separadas
por extensos intervalos nas faixas que beneficiam, antes de tudo, as
concessionárias do serviço de ônibus.
Alguns comentários meus, anteriores,
em azul:
20/08/2013: Num dos sistemas
mais complexos da civilização moderna, o transporte, não há como gerar estudos
confiáveis sem uma enorme dose de competência técnica em várias especialidades.
Mas as “soluções” dos políticos são
tiradas do bolso do colete, sem bases sólidas. Político no Brasil age por
impulso e por instinto. Os resultados, em geral, costumam não passar de
estelionato eleitoral.
28/08/2013: Bem, então a primeira conclusão é que a fator
mais importante para diminuir custos é aumentar a produtividade. Como?
1)
Aumentando
a velocidade média de circulação dos ônibus. Caso a velocidade dobre, em
condições ideais a mesma frota pode transportar o dobro de passageiros (mas de
nada adianta os ônibus chegaram mais rapidamente ao ponto final para ficarem
parados por mais tempo). Simples de falar, mas não tão simples de realizar.
Essa questão depende da gestão sistêmica do trânsito como um todo e de
investimentos pesados em verdadeiros corredores de ônibus (conforme
já expliquei, o emprego descontrolado de faixas exclusivas pode resultar num
tiro pela culatra, a menos de em longas avenidas). Faixa exclusiva não é o
único modo de se dar maior prioridade à circulação de ônibus. Há outros que
precisam ser explorados, o que exige mais recursos e competência técnica em
gestão de trânsito e planejamento de transporte por parte das prefeituras.
03 de setembro de 2013: É evidente que muitos carros
atravancam o trânsito, eles ocupam demais o espaço das ruas por pessoa
transportada. É evidente que o transporte coletivo deve ser priorizado. É
evidente que no conflito atual o uso intensivo de carros deve (e pode) ser
progressivamente desestimulado. Mas isso não pode ser feito de
afogadilho, é preciso planejamento e implantação escalonada de ações corretas e
concretas. Por outro lado, é bom não esquecer que no transporte individual
é o indivíduo que arca com seus custos (sem considerar investimentos públicos
em infraestrutura; esses sim devem se voltar prioritariamente para o transporte
público). Custo de investimento em “material rodante”, “motoristas”,
combustíveis, pneus, manutenção, seguros, depreciação e, ah, impostos e taxas.
Somente sobre combustíveis incidem ICMS (até 25% para gasolina e álcool),
Cide-combustíveis (hoje zerada em função da macropolítica econômica do governo
federal, na tentativa de segurar a inflação, mesmo explodindo 40 anos de
pró-álcool e detonando a credibilidade da Petrobras), PIS, Cofins e imposto de
importação. Fora IPVA, taxas de licenciamento e impostos sobre produtos
(veículos e peças de manutenção). E sem considerar a arrecadação com multas...
O transporte individual por automóveis já subsidia muito mais do que o
transporte coletivo, subsidia boa fração da economia brasileira. Mas tem gente
se esforçando para matar a galinha dos ovos de ouro.
17 de setembro de 2013: A prefeitura de São Paulo descobriu
em excelente meio de promoção; a cada duas semanas anuncia a implantação de
mais 10 ou 20 quilômetros de faixas exclusivas de ônibus, mantendo a atenção da
mídia... Pesquisas vêm sendo publicadas sobre o tema: como os passageiros estão
percebendo a iniciativa? E os motoristas de carros particulares? Já está
ocorrendo migração do transporte particular para o coletivo? ... Acredito que
uma migração em massa do transporte individual para o coletivo é algo que não
ocorrerá tão cedo. Nossas grandes cidades, São Paulo inclusive, estão longe de
reunir as condições mínimas necessárias para o início de um círculo virtuoso
nesse sentido. Será preciso muita competência técnica (em falta), investimentos
(em falta), menos política (em excesso) e tempo para a readaptação das cidades
e ocorrência de mudanças culturais... Esperar o que então? Muita propaganda
enganosa nas próximas eleições.
23 de setembro de 2013: A inutilidade das CPI(s): Após seis sessões ordinárias de
audiências que duram praticamente um dia (agora já são 13 ou 14), os nobres
vereadores continuam tentando entender por alto como funciona o sistema de
transporte coletivo sobre pneus na cidade. Continuam focando a atenção em
“amendoins” enquanto os elefantes que realmente pesam na composição dos custos
continuam tranquilamente vivendo suas atividades diárias... Ao contrário do que
esperavam, não encontraram nenhum grande monstrengo administrativo que esteja elevando o custo de operação em qualquer nível significante... Nenhum dos itens
que aponto como possíveis fontes de economia (28 de setembro de 2013) foi
sequer cogitado pela CPI. Resumindo, eles estão relacionados com a
produtividade da operação das frotas, integração metropolitana, desonerações de
impostos, incluindo gravames trabalhistas, financiamento de bens de capital,
simplificações fiscais e administrativas e mais alguns.
Em paralelo, a CPI dos vereadores de São Paulo tem dedicado
um tempo desproporcional à denúncia de cartel feita pela Empresa Siemens, que
envolveria basicamente o transporte sobre trilhos, por conta do governo do
Estado e em contratos com empresas envolvidas na bilhetagem eletrônica. Por quê? Eles dão mil razões, mais do que esfarrapadas. Espero para os
próximos meses pelo menos mais um Editorial do Estadão sobre o fracasso dessa
CPI em propor saídas viáveis para os problemas do transporte por ônibus na
cidade de São Paulo.
03 de dezembro de 2013
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