terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Fernando Travando


 


Volto ao tema (i)mobilidade urbana.

Dos jornais brasileiros de grande circulação que consulto quase diariamente, o “Estadão” é o que mais tem se dedicado ao assunto trânsito, seja em segurança ou em mobilidade. Infelizmente, como comentei em mais e uma ocasião, essas opiniões não são suficientes para sacudir a sociedade ao ponto de motivar transformações essenciais rapidamente.

Aliás, desconfio que alguém da redação do Estadão tem lido secretamente meus posts... Invariavelmente as opiniões expressas coincidem com pontos que coloquei em postagens anteriores, he, he... 

O título deste post consta do texto de recente Editorial do Estadão “A Cidade dá o Troco” (ou se vinga?).

Sobre a imobilidade urbana escrevi cerca de nove posts nos últimos meses, apontando vícios de executivos e legislativos em geral. Com relação ao último Editorial do Estadão há alguns pontos de coincidência interessantes.

 

Editorial de 03 de dezembro de 2013 (em vermelho)

São Paulo está lhe dando [prefeito Hadad] o troco por outra barbeiragem pela qual não só não dá o braço a torcer, como ainda promete agravar. O desastre continuado é a crise do já terrível trânsito na cidade devido à combinação de populismo e de interesses privados que o levou a criar com uma simples demão de tinta faixas exclusivas para ônibus na pista da direita das vias escolhidas. O prefeito, já agraciado pelos paulistanos com o apelido "Fernando Maldade", faz jus, cumulativamente, ao de "Fernando Travando", tais os congestionamentos bem acima de 100 quilômetros que tem provocado, já pela manhã e em locais muito menos sujeitos a tais suplícios nos períodos fora de pico. Apoiado, se não instigado, por seu secretário de Transportes, o empresário petista Jilmar Tatto, de afamada família, Haddad empurrou para o último círculo do inferno da mobilidade urbana a legião dos que recorrem ao automóvel particular, para o seu ir e vir, e os taxistas proibidos de apanhar ou deixar passageiros salvo em áreas separadas por extensos intervalos nas faixas que beneficiam, antes de tudo, as concessionárias do serviço de ônibus.

Alguns comentários meus, anteriores, em azul:

20/08/2013: Num dos sistemas mais complexos da civilização moderna, o transporte, não há como gerar estudos confiáveis sem uma enorme dose de competência técnica em várias especialidades.  Mas as “soluções” dos políticos são tiradas do bolso do colete, sem bases sólidas. Político no Brasil age por impulso e por instinto. Os resultados, em geral, costumam não passar de estelionato eleitoral.

28/08/2013: Bem, então a primeira conclusão é que a fator mais importante para diminuir custos é aumentar a produtividade. Como?

1)      Aumentando a velocidade média de circulação dos ônibus. Caso a velocidade dobre, em condições ideais a mesma frota pode transportar o dobro de passageiros (mas de nada adianta os ônibus chegaram mais rapidamente ao ponto final para ficarem parados por mais tempo). Simples de falar, mas não tão simples de realizar. Essa questão depende da gestão sistêmica do trânsito como um todo e de investimentos pesados em verdadeiros corredores de ônibus (conforme já expliquei, o emprego descontrolado de faixas exclusivas pode resultar num tiro pela culatra, a menos de em longas avenidas). Faixa exclusiva não é o único modo de se dar maior prioridade à circulação de ônibus. Há outros que precisam ser explorados, o que exige mais recursos e competência técnica em gestão de trânsito e planejamento de transporte por parte das prefeituras.  

 

03 de setembro de 2013: É evidente que muitos carros atravancam o trânsito, eles ocupam demais o espaço das ruas por pessoa transportada. É evidente que o transporte coletivo deve ser priorizado. É evidente que no conflito atual o uso intensivo de carros deve (e pode) ser progressivamente desestimulado. Mas isso não pode ser feito de afogadilho, é preciso planejamento e implantação escalonada de ações corretas e concretas. Por outro lado, é bom não esquecer que no transporte individual é o indivíduo que arca com seus custos (sem considerar investimentos públicos em infraestrutura; esses sim devem se voltar prioritariamente para o transporte público). Custo de investimento em “material rodante”, “motoristas”, combustíveis, pneus, manutenção, seguros, depreciação e, ah, impostos e taxas. Somente sobre combustíveis incidem ICMS (até 25% para gasolina e álcool), Cide-combustíveis (hoje zerada em função da macropolítica econômica do governo federal, na tentativa de segurar a inflação, mesmo explodindo 40 anos de pró-álcool e detonando a credibilidade da Petrobras), PIS, Cofins e imposto de importação. Fora IPVA, taxas de licenciamento e impostos sobre produtos (veículos e peças de manutenção). E sem considerar a arrecadação com multas... O transporte individual por automóveis já subsidia muito mais do que o transporte coletivo, subsidia boa fração da economia brasileira. Mas tem gente se esforçando para matar a galinha dos ovos de ouro.

17 de setembro de 2013: A prefeitura de São Paulo descobriu em excelente meio de promoção; a cada duas semanas anuncia a implantação de mais 10 ou 20 quilômetros de faixas exclusivas de ônibus, mantendo a atenção da mídia... Pesquisas vêm sendo publicadas sobre o tema: como os passageiros estão percebendo a iniciativa? E os motoristas de carros particulares? Já está ocorrendo migração do transporte particular para o coletivo? ... Acredito que uma migração em massa do transporte individual para o coletivo é algo que não ocorrerá tão cedo. Nossas grandes cidades, São Paulo inclusive, estão longe de reunir as condições mínimas necessárias para o início de um círculo virtuoso nesse sentido. Será preciso muita competência técnica (em falta), investimentos (em falta), menos política (em excesso) e tempo para a readaptação das cidades e ocorrência de mudanças culturais... Esperar o que então? Muita propaganda enganosa nas próximas eleições.

23 de setembro de 2013: A inutilidade das CPI(s): Após seis sessões ordinárias de audiências que duram praticamente um dia (agora já são 13 ou 14), os nobres vereadores continuam tentando entender por alto como funciona o sistema de transporte coletivo sobre pneus na cidade. Continuam focando a atenção em “amendoins” enquanto os elefantes que realmente pesam na composição dos custos continuam tranquilamente vivendo suas atividades diárias... Ao contrário do que esperavam, não encontraram nenhum grande monstrengo administrativo que esteja elevando o custo de operação em qualquer nível significante... Nenhum dos itens que aponto como possíveis fontes de economia (28 de setembro de 2013) foi sequer cogitado pela CPI. Resumindo, eles estão relacionados com a produtividade da operação das frotas, integração metropolitana, desonerações de impostos, incluindo gravames trabalhistas, financiamento de bens de capital, simplificações fiscais e administrativas e mais alguns.

Em paralelo, a CPI dos vereadores de São Paulo tem dedicado um tempo desproporcional à denúncia de cartel feita pela Empresa Siemens, que envolveria basicamente o transporte sobre trilhos, por conta do governo do Estado e em contratos com empresas envolvidas na bilhetagem eletrônica. Por quê? Eles dão mil razões, mais do que esfarrapadas. Espero para os próximos meses pelo menos mais um Editorial do Estadão sobre o fracasso dessa CPI em propor saídas viáveis para os problemas do transporte por ônibus na cidade de São Paulo.

03 de dezembro de 2013

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