quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Leis para obrigar o governo a cumprir leis?


 


Acabou de passar pela Comissão de Constituição de Justiça do Senado o Projeto de Lei 329/2012, proposto pelo Senador Vital do Rego Filho que propõe:

 

Ementa: Acrescenta art. 320-A ao Código Brasileiro de Trânsito (Lei n. 9.503/97) para configurar como ato de improbidade administrativa a aplicação de receita arrecadada com multas de trânsito em outra atividade que não sinalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento, fiscalização e educação de trânsito. Estabelece para tal ato a pena prevista no art. 12, II da Lei n. 8.429/92 (Lei de improbidade administrativa, ou seja, ressarcimento integral de dano,...), perda da função pública, suspensão dos direitos políticos e cinco a oito anos, pagamento de multa, etc., etc.

 
Lei para o aparato oficial cumprir lei? Vamos supor que essa lei passe por todos os tramites oficiais no Senado e na Câmara e seja sancionada sem vetos pela Presidência da República. Alguém acredita que algo vai mudar no trânsito brasileiro? Tenho a mais absoluta certeza que essa lei será mais uma natimorta no gigantesco cemitério de leis ignoradas no Brasil PELOS SETORES PÚBLICOS!

Dos 125 artigos e mais de 91.000 palavras que já publiquei neste Blog grande parte estava focada exatamente nessa questão. A calamidade do trânsito brasileiro, que só faz piorar ano a ano, se deve PRINCIPALMENTE ao absoluto descaso com que as autoridades em todos os níveis consideram as leis de trânsito no que lhes competem, enquanto viciosamente colocam a culpa por tudo nos motoristas. Sobre a questão do uso indevido do dinheiro das multas, escrevi alguns artigos: “Dinheiro das multas de trânsito serve até para o café da CET” e “Ilegal: arrecadação de multas financia 100% das atividades (fins e meios) de gestão do trânsito em muitos municípios”, de 16 e 17 de abril de 2013, respectivamente.

Cansei de escrever sobre o descaso paralelo dos pretensos órgão fiscalizadores de nossa imatura República, que ignorando solenemente a tragédia anual dos mais de 60.000 mortos e talvez 500.000 feridos, fora o stress da incivilidade, não investigam e punem a prevaricação das autoridade e órgãos (in)competentes pelo não cumprimento de inúmeros artigos do CTB. Procuradorias da República e dos Estados, Procuradores, Tribunais de Contas em todos os níveis, e até mesmo importantes Associações de Classe como a OAB são imunes a esses problemas. A omissão nos legislativos é total, com raros espasmos que geram novas leis nem sempre apropriadas. As leis secas são um exemplo, até hoje envoltas em imbróglios jurídicos.   

Com o título “Ignorando a responsabilidade legal” escrevi cinco artigos entre 18 e 21 de julho de 2011.

A Política Nacional de Trânsito foi simplesmente esquecida, apesar de ter sido criada mediante direcionamento do CONTRAN, órgão máximo normativo do Sistema Brasileiro de Trânsito, conforme EXIGE O CTB EM ARTIGO DA LEI.

O Ministério da Educação ignora desde antes no novo CTB todas as suas OBRIGAÇÕES LEGAIS de instituir educação para o trânsito nas grades curriculares. Sobre isso escrevi dois artigos em 25 e 28 de maio de 2013. Problema é ainda mais vergonhoso porque o próprio Ministério da Educação e o CNE (Conselho Nacional de Educação) prepararam uma Resolução, a qual foi formalmente aprovada em julho de 2010. Essa Resolução traz o seguinte inciso: 1° Outras leis específicas que complementam a Lei nº 9.394/96 [LDB]  determinam que sejam ainda incluídos temas relativos à ... e à educação para o trânsito (Lei nº 9.503/97 – Código de Trânsito Brasileiro).  O MEC não segue nem mesmo suas diretrizes e tudo fica como está.

 
Ora, pergunto, por que todos os responsáveis por ignorar suas responsabilidades legais não são incluídos na Lei sobre improbidade administrativa, neste sistema trânsito que causa enormes prejuízos emocionais e materiais ao país, além de nos colocar em posição vergonhosa no mundo?

 
Se olharmos um por um os artigos do CTB encontramos dezenas de obrigações legais para as quais as autoridades fecham os olhos. Escrevi sobre várias. Gostaria de dar mais um exemplo, segundo trecho de uma postagem de 03 de abril de 2013:

 
Será que a ‘dura lex sed lex” se aplica somente aos cidadãos? Quando uma lei maior estabelece que determinados órgãos oficiais devem fazer isso ou aquilo, podem eles simplesmente ignorar a lei? Já fiz e respondo essa pergunta, na prática podem e fazem, como veremos mais uma vez.

Vejamos o que o CTB – Código de Trânsito Brasileiro, de 1998, estabeleceu:

Art. 19. Compete ao órgão máximo executivo de trânsito da União:

X - organizar a estatística geral de trânsito no território nacional, definindo os dados a serem fornecidos pelos demais órgãos e promover sua divulgação;

Esse órgão é o DENATRAN. Repito mais uma parte da postagem de 03 de abril de 2013 sobre esse tema:

Parecia que desta vez um objetivo seria transformado em realidade, pois o CONTRAN, Conselho Nacional de Trânsito liberou em 26 de outubro de 2006 (dois anos depois da PNT) a Resolução 208, com o propósito de estabelecer um sistema estatístico nacional. Resoluções CONTRAN têm força de lei. O “considerando” no início desta postagem aparece na introdução dessa resolução. Vejamos apenas seu primeiro artigo:

“Art. 1º Fica instituído o Registro Nacional de Acidentes e Estatísticas de Trânsito - RENAEST, sob a coordenação do Departamento Nacional de Trânsito - DENATRAN, integrado pelos órgãos e entidades do Sistema Nacional de Trânsito – SNT.”

 O RENAEST substituiria o tal SINET, que nunca funcionou direito.

Em obediência a essa ordem do CONTRAN, o DENATRAN, Departamento Nacional de Trânsito, emitiu a Portaria No. 82 em 16 de novembro de 2006, com regulamentações adicionais. Quero aqui ressaltar apenas um inciso dessa portaria:

Art.1º  § 3º O Sistema RENAEST está disponível no Portal de estatísticas de Trânsito no site oficial do DENATRAN cujo endereço é www.denatran.gov.br, no link estatísticas. 

É isso mesmo, ESTÁ DISPONÍVEL. Mas desde então o que se vê no Site do DENATRAN é a seguinte mensagem:

 
O Portal RENAEST e o Sistema RENAEST estão passando por manutenção.
 

Esse é apenas um exemplo. Em manutenção desde 2008/2009? Não estão fazendo absolutamente NADA! E NINGUÉM É RESPONSABILIZADO! Essas estatísticas, se bem usadas, poderia salvar milhares de vidas todos os anos.  Recorde-se que o DENATRAN recebe (teoricamente) 5% do valor de todas as multas arrecadadas no país. Já fiz a pergunta, para onde tem ido esse dinheiro DESDE O INÍCIO?

Um país que precisa fazer leis para que os dirigentes cumpram outras leis não sei nem mesmo como qualificar. E a nova lei não vai ser cumprida porque as leis nunca determinam claramente o que significa não cumprir a lei. A interpretação dos municípios para o artigo 340 do CTB:

[é proibida] a aplicação de receita arrecadada com multas de trânsito em outra atividade que não sinalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento, fiscalização e educação de trânsito...  

sempre foi: para poder realizar essa tarefas nós precisamos ter DEPARTAMENTOS BUROCRÁTICOS, com centenas de funcionários, contínuos, faxineiros, guardas noturnos, REQUERENDO PAGAMENTO DE DESPESAS ADMINISTRATIVAS, SALÁRIOS, APOSENTADORIAS, PENSÕES, ETC. Nada mais “LÓGICO” QUE TUDO ISSO SEJA FINANCIADO PELAS MULTAS...  

O legislador não se preocupou em definir claramente que tipos de despesas podem ser cobertas pelo Artigo.

A nova lei igualmente não define PRECISAMENTE quais são as despesas cabíveis (dizem que isso fica para a regulamentação). Algo vai mudar?

 E LA NAVE VÁ...

 04 DE DEZEMBRO DE 2013

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