quarta-feira, 27 de março de 2013


Desapareceu!

Em primeiro lugar, quero deixar claro que não é minha intenção politizar o assunto, mas devo ser objetivo. Como “o exemplo vem de cima” é necessário começar em Brasília e pelo poder executivo, por enquanto. Já escrevi várias vezes em minhas postagens que nas altas esferas públicas ninguém tem dado a devida prioridade à segurança e civilidade no trânsito, porém há um partido político na presidência da república desde 2002. O que suas administrações têm feito?
É um fato, a PNT – Política Nacional de Trânsito – desapareceu. Escafedeu-se. Exemplares estão perdidos em arquivos pdf escondidos em computadores abarrotados (forneci um link na postagem anterior), ou em gavetas em vários gabinetes ministeriais, onde ninguém se preocupa mais em lhes dar uma simples “olhadinha”. “Substitutas” toscas estão em vigor (?), como veremos.
Mas esse morto não foi sepultado. Temos o direito de cobrar os resultados que ela (a política) se propunha a atingir. Resultados que não vieram. A PNT de 2004 não pode ser esquecida a menos que venha ser substituída por outra mais ambiciosa. Navegar sem políticas definidas, sem objetivos e metas é navegar sem GPS, sem cartas náuticas, sem radar, sem bússola. E é exatamente isso que vem sendo feita pelas mais altas autoridades do país há uma década.
Nessas alturas vale perguntar se a PNT de 2004 era boa. Qual é sua opinião, senhor colunista?

Bem, pelo menos era uma Política. Prolixa talvez. Incompleta sem dúvida, mas bem intencionada. Continha (na verdade contém!) objetivos e metas, como convém às Políticas. Se tivesse sido seguida nestes últimos dez anos, se todos os responsáveis pelo “sistema trânsito” brasileiro tivessem se orientado pelo norte que a PNT apontava, as coisas estariam bem melhores hoje. Todavia, ela TEM uma falha, uma séria falha: NÃO INCORPOROU AS RECOMENDAÇÕES DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE conforme estudo: World Report on Road Traffic Injury Prevention. Tratei desse tema em algumas postagens em junho de 2001. Vale relembrar um trecho de uma delas:

“Citei novamente a ONU [OMS] em postagem do dia 08/06/2011, enfatizando o relatório de 2004 “World Report on Road Traffic Injury Prevention” – WRRTIP, para o qual, conforme relatei, o então presidente Lula contribuiu com uma mensagem no prefácio. Disse ele: “As in other Latin American countries, there is a growing awareness in Brazil as to the urgency of reversing this trend. The Brazilian Government, through the Ministry of Cities, has put considerable effort into developing and implementing road security, education campaigns and programmes that emphasize citizen involvement”. Traduzindo: “Como em outros países da América Latina, existe uma crescente conscientização no Brasil quanto à urgência em reverter essa tendência [a morte de 30 ~ 40 mil pessoas por ano e outras conseqüências dos acidentes de tráfego]. O Governo Brasileiro, através do Ministério das Cidades, tem realizado considerável esforço em desenvolver e implantar a segurança nas vias, campanhas de educação e

programas que enfatizam o envolvimento dos cidadãos.” Vou me abster de analisar esse prefácio, mas devo lembrar que como o resultado – reverter a tendência urgentementenão ocorreu, o mínimo que podemos concluir é que o “considerável esforço” foi e continua sendo insuficiente e/ou inadequado.”

E continua não ocorrendo... E continua não havendocrescente conscientização no Brasil quanto à urgência em reverter essa tendência”; por parte dos executivos federal, estaduais e municipais; pelo legislativo federal; por Procuradorias; por importantes associações de classe, como OAB, CREA(s), ADC(s) e outras. Não há PROCON(s) para defender os cidadãos conscientes contra o caos e barbáries no trânsito, provocados por (muitos) motoristas inconsequentes e gestão de trânsito incompetente. A Justiça, leis, juízes e tribunais continuam lenientes. 
Bem, o que a PNT não incluiu dos 26 pontos que o relatório WRRTIP julgava prioritário como responsabilidade de governos?

Neste momento apontarei apenas uma, a primeira recomendação, sem a qual nada mais funciona, lembrando, porém, que outras recomendações, importantíssimas, também não foram incorporadas. Mas alguém tem o direito de perguntar: “e daí, se essa tal Política como um todo foi abandonada?” A resposta: quando um governo mais competente e responsável decidir elaborar uma Política para valer, não pode se esquecer de começar pelo principal.  Bem, aqui está a grande lacuna:

O que governos podem [devem] fazer
Desenvolvimento institucional:
“Fazer da segurança no trânsito uma prioridade política”

Então é isso que a ONU / OMS via WRRTIP colocou em primeiro lugar. Em várias postagens anteriores procurei dissecar essa questão. Por que a segurança (e civilidade) no trânsito não é motivo de alta preocupação para governos (em todas as esferas), políticos e funcionários públicos? Por que apenas ações isoladas aqui e ali, sem profundidade e continuidade? Por que a sociedade não reage de modo contundente e contínuo? Apesar do “novo” Código de Trânsito Brasileiro de 1997 continuamos sendo uma sociedade imatura em matéria de trânsito, incapaz de enfrentar de modo eficaz esse enorme flagelo e não há ninguém nos puxando a orelha.

Mas vou voltar à insepulta Política Nacional de Trânsito de 2004, repetindo um parágrafo que reflete a própria essência de minhas postagens:

2. POLÍTICA NACIONAL DE TRÂNSITO

2.1. Marco Referencial

2.1.3.2. A cidadania, a participação e a comunicação com a sociedade

Um trânsito ruim e no limite criminoso, por falta de consciência dos seus perigos e por falta de punição, aproxima-nos da barbárie e do caos. Por outro lado, um trânsito calmo e previsível estabelece um ambiente de civilidade e de respeito às leis, mostrando a internalização (sic) da norma básica da convivência democrática: todos são iguais perante a lei e, em contrapartida, obedecê-la é dever de todos.

 
Então os governos Lula reconheceram essa verdade! Sim, tínhamos e temos um trânsito ruim, não no limite, mas DENTRO do criminoso. Sim, por falta de consciência (mas eu não diria apenas de seus perigos), por ausência absoluta de educação AMPLA, COMPLETA, DISSEMINADA E CONTÍNUA para o trânsito, responsabilidade exclusiva do poder público, sob orientação do Ministério da Educação. Sim, por falta de punição, em função de lacunas institucionais e de gestão graves, onde os poderes públicos não exercem nem de longe suas responsabilidades de “enforcement”, sejam de fiscalização, sejam de punição em função, como visto, da leniência das leis, dos juízes e tribunais, e das execuções penais. Sim, obedecer a lei é dever de todos, mas as autoridades de trânsito não podem se esconder sob o falso argumento de que “os motoristas são os únicos responsáveis, eles não colaboram”.

Em próximas postagens veremos objetivos e metas da PNT que não foram alcançados/alcançadas. Veremos que essa é uma excelente razão para o governo federal ter “se esquecido” da Política que ele mesmo criou. “Eu? Comprometer-me?”

 
Escrito por Paulo R. Lozano em 27 de março de 2013

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