Volto ao tema
que pré-ensaiei em 24 de junho de 2013.
São
bem-vindas as discussões sobre mobilidade urbana que os protestos de junho detonaram,
independentemente do que possa vir a acontecer – provavelmente pouco de
concreto e positivo na maioria das grandes concentrações urbanas do país. Com
as discussões e a prova do tempo, porém, alguns mitos poderão ser desacreditados.
Um deles, muito explorado por prefeitos e vereadores é que eles (quando
candidatos ou em tempos de alta pressão popular como agora) vão imprimir
melhorias dramáticas, sem aumento, ou mesmo com diminuição de custo já em sua primeira
gestão, fazendo tudo diferente do que vinha sendo feito por seus antecessores.
Em primeiro
lugar, gostaria de lembrar que os conceitos de “mobilidade”, “mobilidade
urbana” e “transporte sustentável”, como hoje empregados, são relativamente
recentes e começaram a ser divulgados a partir de sua crescente aparição de uns
trinta anos para cá em importantes congressos de Engenharia, ITS (Inteligent
Trasnportation Systems) e Urbanismo nos países adiantados. Num dos sistemas
mais complexos da civilização moderna, o transporte, não há como gerar estudos
confiáveis sem uma enorme dose de competência técnica em várias especialidades.
Mas as “soluções” dos políticos são tiradas do
bolso do colete, sem bases sólidas. Político no Brasil age por impulso e por
instinto. Os resultados, em geral, costumam não passar de estelionato eleitoral.
Tomando a CPI
de São Paulo como exemplo – CPI PARA AVERIGUAR PLANILHAS DE CUSTOS DO
TRANSPORTE COLETIVO NO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO – (ver postagem de
4/07/2013, Festival de CPIs) percebe-se primeiro que é chapa branca e
foi instalada apenas para o poder legislativo do município, com sua imagem
altamente (e mais do que merecidamente) desgastada fingir para a população
“protestante” que “fez alguma coisa”, quando deveria “estar fazendo” todos os
dias, ano após ano. Os nobres Edis instalaram às pressas uma CPI sem ter em
mãos qualquer indício concreto de ilícitos resultantes de investigações,
auditorias ou denuncias documentadas (não que eles não existam, mas se existem
dificilmente virão à tona nesse fórum). Investigar
“planilhas de custos”? Não duvido que as conclusões e recomendações finais da tal CPI serão
verdadeiros monstrengos políticos, sem qualquer relação com “investigar
planilhas de custos”, algo em si absolutamente inócuo. Talvez eles tentem
realimentar o mito da “caixa preta” dos contratos com empresas de ônibus. Como
disse, pago para ver.
Claro, a
população protestou e vai continuar protestando: sua percepção é que o
transporte (ainda falo dos ônibus) é caro contra a qualidade exibida. Por má
qualidade entenda-se, mais ou menos pela ordem: longos tempos de percurso
(baixa velocidade), tempo médio excessivo de espera nos pontos, excesso de
lotação (principalmente nos horários de pico; ônibus lotados que não param no
ponto), má distribuição das linhas e pontos (caminha-se muito até os pontos),
falta de conforto (ruidoso, quente, mal ventilado, etc.), dificuldade de
acesso, habitáculo sujo e/ou mal conservado, motoristas e cobradores agressivos, etc., etc.
O poder executivo,
por sua vez, não está se saindo melhor. Igualmente às pressas e sem base em
estudos técnicos profundos começou a pintar “faixas exclusivas” a torto e a
direito no asfalto de avenidas, ruas e vielas da cidade. “A prioridade é dos
ônibus”, alardeiam estufando o peito. Só agora? E quem disse ao prefeito que
isso vai resultar em melhorias capazes de satisfazer o povo? Se não der, o que
é mais do que provável, em São Paulo e em outras cidades, há tempo mais do que
suficiente para que as besteiras que estão sendo jogadas para o alto caiam em
cima das cabeças dos senhores prefeitos antes da próxima eleição. Não vai ser
fácil encontrar bodes expiatórios.
Vale a pena
repetir (em itálico abaixo) dois parágrafos da postagem de 24 de junho:
O principal fator da pequena produtividade
do transporte por ônibus, mais do que conhecido é a baixa velocidade média do
trânsito, em corredores ou não, nos horários de pico (que já se emendam durante
o dia). Por sinal, dizer que São Paulo possui verdadeiros corredores de ônibus
é caridade, na verdade existem faixas exclusivas e olhe lá. E muito mal
aproveitadas.
A velocidade média nos “corredores” e faixas atuais está limitada pelos
fatores: trânsito congestionado, quantidade de cruzamentos com faróis e
restrições nos tempos de abertura destes... os tempos não podem ser exageradamente
aumentados sem que o congestionamento que se espalha pelas ruas vizinhas
envenene de volta o corredor.
De fato, denominar os atuais
“corredores de ônibus” de São Paulo com esse nome é caridade. O corredor ideal
deve operar mais como uma linha férrea de superfície (em pistas realmente
exclusivas) do que como uma simples linha de ônibus, mesmo operando do lado
esquerdo da via; devem existir plataformas para embarque rápido e não pontos de
ônibus no nível da rua; deve haver uma linha operando entre grandes terminais
de distribuição, com a frequência de carros ditada pela demanda do momento, a
fim de eliminar esperas ou necessidade de ultrapassagens em pontos; as
passagens têm que ser adquiridas antes do embarque; as interferências de
trânsito têm de ser eliminadas de um jeito ou de outro (o que se torna
caríssimo de fazer em áreas urbanas densas e consolidadas); e outras. No máximo pode-se dizer que os corredores e
ônibus de São Paulo são modelos híbridos.
Quanto às faixas exclusivas à
direita das vias, suas virtudes são limitadas. Até concordo que devam existir,
mas não se pode esperar milagres delas. Um famoso urbanista americano disse há
tempos que “as pistas de alta velocidade são o caminho mais rápido entre dois
congestionamentos” e faixas exclusivas de ônibus, de certo modo, não passam
disso, acesso rápido até o próximo trecho de trânsito lento. Quando há excesso de interferências (principalmente cruzamentos) não há como aumentar significativamente a
velocidade média. As exceções estão em longas vias expressas isoladas, como nas
marginais, poucas em São Paulo.
Enfim, a baixíssima produtividade
dos ônibus, fruto principalmente do urbanismo precário de nossas cidades e do
trânsito pessimamente gerenciado é uma das duas principais causas do elevado
CUSTO de operação dos sistemas de ônibus. A outra, nenhuma novidade, é o custo
Brasil, que como um câncer jamais diminui. Impostos, taxas, legislação
e problemas trabalhistas, práticas fiscais paranoicas, juros reais elevadíssimos, excesso de
burocracia, dirigismo estatal, caixinhas obrigatórias... Políticos já falam em
aumentar os impostos sobre combustíveis, dos mais taxados do mundo, para
“subsidiar” o transporte coletivo, como se isso já não fosse feito. Finalmente,
tentativas tímidas de diminuir alguns custos estão sendo colocadas em prática, mas
contra protestos veementes das autoridades monetárias... Se der com uma mão tem
de tirar com a outra...
Na próxima
postagem vou mostrar por que os custos do transporte coletivo por ônibus nas condições atuais não pode ser muito mais baixo. Não há boca livre.
20/08/2013
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