Na última
postagem começamos a ver que ou por que os que sonham que o transporte público
(por ônibus) pode ser muito mais barato para a sociedade do que o transporte
individual estão enganados. Isso não significa em absoluto que não deva haver
oferta adequada desse modal de transporte nas cidades, a preço acessível,
seguro, rápido e confortável. Nem que o carro particular deva se sobrepor ao transporte
público. Mas isso tudo tem um custo, que de algum modo seria pago pela
sociedade. Se por tarifas cheias, apenas pelos usuários. Se subsidiado, será
pago também pelos contribuintes, inclusive milhares de pobres que sequer o
aproveitam, mas pagam impostos, o que já ocorre hoje.
Os dados de
que me valho a seguir são da SPTrans.
Para começar, vejamos como vem
evoluindo a demanda. Em 2012 o número de viagens registrado foi de 2.916.954.960 (quase três bilhões).
Alguém desavisado pode pensar que multiplicando esse número pelo preço da
passagem (R$3,00) se obteria o faturamento das empresas de ônibus, que seria de
R$ 8.750.864.880,00. Engano. Analisemos o gráfico:
A
demanda subiu de uns 2,5 bilhões de passageiros/viagens em 2005 para uns 3
bilhões nos últimos anos (linha azul). Porém, em função das meias passagens,
gratuidades e bilhetes únicos, a quantidade de “passageiros equivalentes”, um
número hipotético que indica quantos passageiros pagando tarifa cheia por
viagem resultaria na arrecadação efetiva que ocorreu, vemos uma linha vermelha
praticamente horizontal, pouco variando em torno de 1,5 bilhão por oito anos
seguidos!
Vejamos
como foi feito esse transporte. Em 2005 a SPTrans registrava 14.627 ônibus e em
2012 14.959, um aumento de apenas 2,3%. Como foi possível acomodar o aumento de
quase 500 milhões de passageiros por ano? Apertando-os cada vez mais? Bem, em
parte isso pode ser verdade, mas a composição da frota se alterou nesse
intervalo, as empresas passaram a comprar ônibus maiores. Entre 12 tipos de
ônibus existentes em 2005, de acordo com a capacidade nominal de cada um seria
possível colocar de uma vez na frota (supondo todos os carros na rua) 876.378
pessoas. Na composição de 2012 o número sobe para 1.076.301, um aumento de 23%,
teoricamente capaz de acomodar o aumento da demanda, que foi de 16%.
Teoricamente.
Agora,
ônibus são peças caras. O preço de um biarticulado pode ultrapassar 900 mil
reais, um articulado 500 mil reais e um Padron 250 mil reais. Os mini e midi
ônibus usados pelos permissionários (antigos perueiros) custam entre 170 e 190
mil reais. A preços de carros novos o investimento na frota está em torno de R$
3,7 bilhões.
O
que ocorreria se, como sugere sua excelência o vereador Roberto Tripoli, carros
e motos fossem de repente INVIABILIZADOS na cidade? De início, a rede de ruas servidas
por linhas precisaria ser enormemente expandida para que as pessoas possam sair
de um ponto e chegar a outro sem enormes percursos a pé. Calculando por outra rota
e na ponta do dedão, a demanda por transporte público aumentaria no mínimo em
mais de 8 bilhões de viagens por ano, a se somar as 3 bilhões de hoje. (Algo
como 5 milhões de veículos, com ocupação media de 1,5 pessoa por veículo e 3 viagens
por dia, bem subestimado). O investimento necessário somente em ônibus, sem
contar garagens, etc., seria de uns R$ 10 bilhões. Por outro lado, já vimos que
a depreciação anual do investimento corresponde a apenas 9% dos custos do
transporte nas condições atuais. Haja dinheiro público.
Continuando
com a análise econômica:
Segundo
a SPTrans, o custo total (incluindo margem de 7%) do sistema ônibus em 2012 foi
de R$ 5.591.366.640,00. A arrecadação dos 1,5 bilhão de passageiros
equivalentes foi de R$ 4.510.743.933. Portanto, faltaram R$ 1.080.622.707 para
fechar a conta. A prefeitura diz que transferiu R$ 953 milhões em subsídio.
Será que as empresas pagaram o mico com 130 milhões de Reais? Não, as
diferenças para mais ou menos são compensadas no orçamento do ano seguinte.
Bem, a se acreditar nesses números percebe-se que o custo por passageiro
transportado foi de (5.591.366.640) dividido por (2.916.954.960). Isso dá R$
1,917. Se todos os transportados pagassem por viagem uma tarifa de R$
2,00 a arrecadação cobriria os custos com sobras. Mas a tarifa é (e não nego
que deva ser, a menos de distorções, que existem) social. Assim, o custo de
fato por passageiro equivalente foi de R$ 3,719. O
subsídio por passageiro transportado foi de R$ 0,33 em 2012 e será bem maior em 2013.
Se
o sistema está saturado colocar mais gente em ônibus não significa aumentar o
faturamento mantendo-se os custos atuais.
Agora
a grande pergunta: os dados da arrecadação versus passageiros transportados são
confiáveis? É exatamente esse aspecto que pode concentrar as maiores distorções
na contabilidade dos transportes coletivos. Diferentemente de trens e metrôs,
nos ônibus (com exceção de verdadeiros corredores, como alguns de Curitiba) não
se ingressa em plataformas de embarque somente com a posse de bilhetes
controlados eletronicamente. As coisas dependem também do que os contratos
estipulam, por exemplo, pode-se remunerar por viagem, por quilômetro rodado,
por giro de catraca...
Para
essa pergunta não tenho resposta. Mas posso afirmar que esse é o ponto que
deveria receber a máxima atenção na fiscalização pelos contratantes, sejam
agências como a SPTrans e TCM(s). As próprias empresas temem que motoristas e
cobradores burlem a arrecadação em proveito próprio e fazem sua própria
fiscalização. Fato é que a progressiva informatização dos sistemas de
arrecadação tem facilitado as auditorias, mas...
Como
então diminuir o custo do transporte coletivo? Sem dúvida essa questão é
do interesse de todos, usuários ou não. Já dei algumas dicas, mas amplio o tema
na próxima postagem.
24/08/2013
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