Corredor da morte
Interrompo (ma non troppo) a
análise da legislação do trânsito brasileiro para discorrer sobre um tema
específico. No Brasil existem corredores da morte. Milhares. Eles foram criados
pela legislação.
Na cidade de São Paulo algumas
rádios dão bom espaço ao trânsito e milhões de motoristas seguem as notícias
com atenção, enquanto se arrastam em seu congestionadíssimo trânsito. Pelo
menos uma rádio tem sua programação dedicada totalmente ao trânsito. Elas são
muito uteis.
Não há dia em que estando no
trânsito com o radio sintonizado numa dessas estações, que não ouço no espaço
de menos de uma hora pelo menos um caso de rua ou avenida total ou parcialmente
bloqueada em função de acidente carro-moto, ônibus-moto, caminhão-moto,
moto-moto ou atropelamento por moto. Procuro na Internet estatísticas diárias
de algum órgão oficial, como o Resgate (Corpo de Bombeiros), ou CET, ou seja lá
de que for, e não encontro. Sabemos que em acidentes de trânsito com vítimas é
obrigatória e emissão de um BO policial, mas... Pela amostragem do que se ouve
nas rádios dezenas de casos devem estar ocorrendo todos os dias.
Mesmo sem estatísticas, sabemos
qual é a causa principal dessa tragédia programada: os CORREDORES DA MORTE.
Comentei parcialmente este fato
em postagem do dia 16 de maio de 2013, a qual versava sobre a segurança passiva
de veículos em geral. Pela importância do assunto vou repetir parte dessa
postagem (em azul) no que se refere às motos:
É importante
aqui frisar que a proibição do tráfego ‘”no corredor” estava prevista na
proposta original do CTB, [em seu artigo 56, dentro do Capítulo III – Das
normas gerais de circulação e conduta] tendo sido vetada em função das seguintes
ALEGAÇÕES:
“Razões do veto: “Ao proibir o condutor de motocicletas e
motonetas a passagem entre veículos de filas adjacentes, o dispositivo
restringe sobre maneira a utilização desse tipo de veículo que, em todo o
mundo, é largamente utilizado como forma de garantir maior agilidade de
deslocamento. Ademais, a segurança dos motoristas está, em maior escala,
relacionada aos quesitos de velocidade, de prudência e de utilização dos
equipamentos de segurança obrigatórios, os quais encontram no Código limitações
e padrões rígidos para todos os tipos de veículos motorizados.”
Esse veto foi
ativado por fortes “lobbies”. O trecho sublinhado acima É EM GRANDE PARTE FALSO:
em países adiantados motocicletas devem obedecer as mesmas regras de circulação
aplicáveis aos outros veículos; é proibida a passagem em corredores ou pela
direita entre veículos e calçadas ou acostamentos. Quanto aos “demais quesitos de velocidade e prudência”,
sabemos que não há fiscalização a respeito, a qual, embora não sendo de
implantação simples não é, por outro lado, impossível. “Equipamentos de segurança obrigatórios” pouco protegem na maioria
dos acidentes, o air bag do motociclista é ele mesmo. Os resultados dessa
legislação e da (não) prática de fiscalização tem sido catastróficos, como
todos sabem, e vêm piorando a cada dia. Pior é o fato de que essa prática estar
consolidada como “direito adquirido” na mente de muitos, tornando quase
impossível ser alterada no futuro. O Brasil se acostumou com as mortes em
volumes de campos de extermínio de ocupantes de motocicletas”.
Confirmando
o dito na postagem de 16/05, raros países adiantados permitem tráfego de
motocicletas no corredor e quando permitem o fazem com restrições. A Bélgica,
por exemplo, permite, mas o diferencial de velocidade é limitado em 20%. Portanto,
quando as filas estão se deslocando rapidamente (próximas da velocidade máxima
permitida) as motos não podem permanecer no corredor e os pilotos obedecem.
Os perigos
de se transitar pelo corredor são muitos, difíceis até de explicitar. Um dos
principais é o diferencial de velocidade, agravante para qualquer tipo de
ocorrência imprevista; outro, evidentemente, é o excesso de velocidade das
motos. Quem dirige pelas marginais de São Paulo sabe, mesmo a 90 km/h em
horários de trânsito livre as motos (todas) passam zunindo pelos corredores. A palavra
prudência parece não constar do dicionário de grande parte dos jovens pilotos de
motocicleta, profissionais ou não, exatamente os que mais morrem ou ficam incapacitados
nos milhares de acidentes pelo Brasil afora por ano. Não há a mínima possibilidade de
haver trânsito seguro nessas condições. Quinze anos de prática depois da entrada
em vigor do CTB comprovam essa afirmação.
O que
fazer para diminuir a carnificina? O correto seria reinstituir o Artigo 56 do
CTB e exercer fiscalização, mas qual é o político que aceitaria o desafio de
tentar?
E por que
não discutir alternativas, como na Bélgica? Por exemplo, poderia ser permitido às
motos, quando o trânsito para completamente em congestionamentos ou sinais, e somente
nessas circunstâncias, avançar cuidadosamente (a fim de evitar atropelamentos) a no
máximo 20 km/h, até que o trânsito volte a andar ou elas atinjam o ponto de parada
em frente ao semáforo. Com isso elas manteriam grande parte de sua “agilidade no
trânsito”.
Mas o mais
provável é que as coisas continuem como estão por mais vinte anos, pelo menos.
12 de junho
de 2013
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