Proposta de Emenda à Constituição (PEC 55) 2
Será que essa PEC, do modo como
está redigida, terá o condão de facilitar a resolução de nosso maior problema
de trânsito?
Tenho cá minhas dúvidas. A
primeira vista parece que sim. Repito aqui parte de uma das justificativas:
... a
presente Proposta de Emenda à Constituição pretende inserir no § 8º, do art.
144, da Constituição Federal, a previsão da existência de órgão municipal de
fiscalização e controle de trânsito, estruturado em carreira, ao qual é
atribuída a competência para exercer as funções de policiamento de trânsito...”
Mas...
Mas primeiro é preciso saber se a intenção do legislador é
realmente entregar aos Municípios, (pelo menos àqueles integrados no Sistema
Nacional de Trânsito) real poder de polícia a fim de que eles possam
efetivamente passar a exercer POLICIAMENTO de trânsito.
Se assim for a razão do inciso II na PEC não faz sentido: “II – A lei
regulamentará o piso remuneratório dos guardas municipais e dos agentes de
fiscalização e controle de trânsito".
É totalmente descabido chegar ao extremo de detalhar em
uma Constituição Federal que determinadas categorias terão pisos salariais
regulamentados. Por não o de todas as categorias profissionais, então,
lembrando que elas são mutáveis no tempo e no espaço?
Quero deixar claro que nada tenho contra a regulamentação
de planos de carreira e pisos salariais de seja lá quem for, especialmente a
dos agentes de trânsito. Em mais de uma postagem elogiei a atuação desses
agentes com seus limitados poderes, incompreendidos pela população e
trabalhando em geral em condições dificílimas. Mas daí a haver norma
constitucional exigindo piso remuneratório...
Não é de se estranhar, portanto, que as associações
representativas dos agentes de trânsito municipais de todo o Brasil têm
exercido forte pressão no Congresso pela rápida tramitação dessa PEC. É direito
deles, mas por outro lado, a carona que esse inciso pegou no texto principal da
PEC me leva a desconfiar de forte motivação política para sua submissão. A
Constituição não deve ser prestar a conveniências políticas ocasionais.
Creio também que a inserção proposta no § 8º do Artigo
144 está longe de ser clara. Ela diz que os Municípios, além de poderem
constituir guardas municipais, passarão a poder constituir “órgãos
municipais de fiscalização e controle de operações de trânsito conforme
dispuser a lei”. Ora, órgãos municipais de fiscalização e controle de
operações de trânsito já existem. Sem dispor de um deles, operacional, um
Município não pode se integrar ao SNT, conforme o CTB. Prestem atenção, não é
uma guarda municipal, que sugere polícia, mas sim um “órgão municipal
de trânsito”. Para que essa redundância? Por que as próprias guardas municipais
não podem assumir essa responsabilidade? Na verdade é porque esses órgãos já existem
(em muitos municípios).
Então o inciso II tenta esclarecer: “II – o órgão municipal de fiscalização e controle
de trânsito, organizado e mantido pelo município e estruturado em carreira,
destina-se, na forma da lei, ao exercício das funções de policiamento de
trânsito, no âmbito da circunscrição municipal”. Aqui surge a palavra policiamento no lugar de fiscalização e controle. Haja confusão, parece até que é proposital.
Muito estranho. Vejo um novo dispositivo constitucional permitindo a
criação de órgãos municipais, destinados ao policiamento de trânsito,
sugerindo que eles devem ser independentes dos órgãos de gestão do trânsito, mas não vejo nada explicitando que será conferido PODER DE POLÍCIA a alguém
dentro desses órgãos. Nem definindo quais e quantos poderes. Poder de polícia de
trânsito significa no mínimo AUTORIDADE POLICIAL para abordar veículos e
cidadãos, a fim de exigir, por exemplo, vistoria de documentos e veículos, retenção
ou apreensão dos mesmos quando irregulares, e até mesmo dar voz de prisão
quando da ocorrência de flagrantes de crimes de trânsito, coisas que hoje os agentes
de trânsito municipais não podem fazer. As palavras “funções de policiamento de
trânsito” são vagas demais; o que isso significa? O poder de polícia (ou quem
possui esse poder) está definido na própria Constituição e sem uma manifestação
explícita de que outros agentes claramente especificados em tipo e formação,
além daqueles que a Constituição hoje reconhece, passarão a exercer esse poder (pelo
menos em certos campos de atuação) haverá evidente conflito entre normas constitucionais
distintas.
“Na forma da lei” pode-se definir quem dentro de um órgão
municipal de fiscalização e controle de trânsito exercerá o policiamento de trânsito nos municípios.
Informei no passado que em Nova Iorque, por exemplo, Agentes Nível 4 (funcionários
do Departamento de Polícia da cidade) tem certo poder de polícia. Mas no Brasil
será necessário que os poderes desses agentes sejam claramente definidos na Constituição.
Não será um órgão municipal, mas sim
pessoas que efetivamente exercerão o patrulhamento ostensivo de trânsito.
Um órgão municipal possui de contínuos a faxineiros, ascensoristas e administradores.
Quem dentro deles terá autoridade policial?
A PEC 55 precisará
ser profundamente discutida antes de ser levada a plenário. Como está ela poderá causar ainda
mais confusão em nosso caótico e fragmentado sistema trânsito.
10/06/2013
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