Segunda feira, 20 de junho de 2011. Os telejornais de São Paulo deram pequeno destaque a mais dois graves acidentes de trânsito ocorridos nas últimas 24 horas na capital. Num deles, um casal caiu de uma motocicleta. O marido, piloto da moto, morreu atropelado. A esposa, grávida de 9 meses, chegou a ser socorrida, mas morreu no hospital. Os médicos tentaram salvar a criança sem sucesso. Ah, mais um acidente apareceu nos telejornais da noite, em Santa Catarina. Dois mortos e dois feridos. Será mera coincidência o fato de esse acidente ter merecido destaque e o motorista ser jogador de um time de futebol?
Pior, mesmo emocionalmente impactantes, esses acidentes foram largamente eclipsados nos noticiários pela queda de um helicóptero na Bahia, pilotado por um rico empresário. Como em qualquer acidente de aviação, seja com um Boeing ou com um Cesna, este será investigado em seus mínimos detalhes por órgão especializado do governo federal (conforme acordos e sistema internacionais de que o Brasil participa), com a finalidade básica de se tomarem medidas preventivas que possam evitar casos similares no futuro. Lembram-se dos esforços da marinha para resgatar destroços do Airbus da Air France que caiu no mar em 2009? Não há nada de errado quanto a isso. Errado é o descaso para com os acidentes de trânsito.
Amanhã ninguém, a não ser familiares e amigos, se lembrará do acidente com o jovem casal motociclista. Nem das aproximadamente cem pessoas que morreram e mil feridos graves em outros acidentes de trânsito por todo o Brasil, nessas mesmas horas, a respeito dos quais poucos ouviram. A cada três dias morrem mais pessoas em nossas ruas e estradas em decorrência de acidentes de trânsito do que naquele acidente de avião, sem mencionar os feridos.
Já disse em postagem anterior que não sou qualificado em ciências sociais, mas não posso deixar de notar certo paralelo entre o comportamento da sociedade em relação aos acidentes de trânsito com o comportamento das manadas de herbívoros da África quando atacadas por predadores, como um bando de leoas. Os animais permanecem atentos, fogem ao menor sinal de perigo e às vezes até procuram defender suas vulneráveis crias, como fazem os búfalos. Todavia, os predadores normalmente abatem uma presa, o suficiente para o sustento do bando. Depois que isso ocorre, sabendo que os predadores estão saciados, a manada continua pastando tranquilamente sem se importar com a presença deles por perto. Para esses animais, perder alguns membros todos os dias faz parte da natureza! Será que estamos tão acostumados com acidentes de trânsito que eles se tornaram parte de nosso contexto social? Mortos no trânsito são para nós como filhotes ou membros velhos e doentes, abatidos por predadores, para gnus, zebras e companhia?
Como um país civilizado pode conviver com isso? Não pode. Se convive, não é civilizado.
Hoje não avancei na análise do sistema trânsito no Brasil, mas o “desabafo” acima precisava ser feito. Em paralelo com as notícias de acidentes que descrevi, ouço falar a respeito de iniciativas isoladas de autoridades para reduzir acidentes aqui e ali, desse ou daquele modo. Nada geral, nada sistêmico, nada profundo, nada duradouro. Um pouco mais do de sempre.
Amanhã deverei voltar à linha geral que venho seguindo.
Escrito por Paulo R. Lozano às 22:00 do dia 20 de junho de 2011 (postado com atraso, Internet inoperante...)
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