Veículos mortais 3 – Segurança Passiva
Para terminar essa breve e incompleta
análise sobre segurança veicular explico alguns conceitos da “segurança
passiva”, características que fazem veículos menos perigosos quando acidentes
acontecem. Os especialistas costumam
dividir a segurança passiva em duas categorias, interna e externa (não
confundir com fatores internos e externos de acidentes), sendo a
primeira composta pelas características que protegem ocupantes de veículos
acidentados e a segunda, características que protegem acidentados externos,
como pedestres, ciclistas e outros.
Segurança passiva interna é uma ideia
relativamente nova e segurança passiva externa mais nova ainda.
Qual é o veículo mais mortal? Sem
dúvida é a motocicleta. Não precisa ser uma supermoto, basta atingir
velocidades de 60 a 80 quilômetros por hora. Nada protege os ocupantes, a não
ser um capacete e eventualmente roupas especiais que pouco podem fazer em
acidentes em velocidades mais altas.
Motos, mesmo as de baixa cilindrada, são veículos ágeis e velozes, em
função da alta relação potência/peso. Sua história se confunde com a dos
automóveis (e veículos mais pesados) e desde os primórdios do século XX ambos
vêm ocupando as mesmas vias, nas mesmas condições. A luta é desigual, mas
historicamente esse fato foi assimilado culturalmente como sendo “normal”.
A inexistência de características de
segurança passiva em motocicletas pode ser agravada, como o é no Brasil por
legislação permissiva (por exemplo, a que não proíbe a circulação em
“corredores” entre filas de veículos* de quatro ou mais rodas) e pela ausência
de fiscalização de infrações de percurso, como excesso de velocidade, dirigir
“costurando”, não obedecer a sinalização de trânsito, avançar sinais vermelhos,
não respeitar faixas de pedestres, e outras.
Assim, motos são campeãs no Brasil em problemas de segurança passiva
tanto interna quanto externa. É
importante aqui frisar que a proibição do tráfego ‘”no corredor” estava
prevista na proposta original do CTB, tendo sido vetada em função das seguintes
ALEGAÇÕES:
* “Razões do veto: “Ao proibir o condutor de motocicletas e motonetas a
passagem entre veículos de filas adjacentes, o dispositivo restringe sobre
maneira a utilização desse tipo de veículo que, em todo o mundo, é
largamente utilizado como forma de garantir maior agilidade de deslocamento.
Ademais, a segurança dos motoristas está, em maior escala, relacionada aos
quesitos de velocidade, de prudência e de utilização dos equipamentos de
segurança obrigatórios, os quais encontram no Código limitações e padrões
rígidos para todos os tipos de veículos motorizados.”
Esse veto foi ativado por fortes
“lobbies”. O trecho sublinhado acima é falso, em países adiantados motocicletas
devem obedecer as mesmas regras de circulação aplicáveis aos outros veículos; é
proibida a passagem em corredores ou pela direita entre veículos e calçadas ou
acostamentos. Quanto aos “demais quesitos
de velocidade e prudência”, sabemos que não há fiscalização a respeito, a
qual, embora não sendo de implantação simples não é, por outro lado,
impossível. “Equipamentos de segurança
obrigatórios” pouco protegem na maioria dos acidentes, o air bag do
motociclista é ele mesmo. Os resultados dessa legislação e da (não) prática de
fiscalização tem sido catastróficos, como todos sabem, e vêm piorando a cada
dia. Pior é o fato de que essa prática estar consolidada como “direito
adquirido” na mente de muitos, tornando quase impossível ser alterada no
futuro. O Brasil se acostumou com as mortes em volumes de campos de extermínio
de ocupantes de motocicletas.
Agora vamos à segurança passiva em
automóveis. Nos últimos 50 anos os projetos evoluíram no sentido de:
·
Preservar uma “célula de segurança”,
que é o habitáculo do veículo. A cabine dever ser resistente, pouco deformável,
isenta o mais possível de áreas de impacto perigosas e não invasiva por
elementos externos a ela;
·
O restante da carroceria deve ser
projetado para ser deformável controladamente em impactos frontais e traseiros.
A deformação controlada absorve em grande parte a energia cinética que, em caso
contrário, seria sentida plenamente pelos ocupantes do veiculo;
·
O teto não deve “afundar” em caso de
capotagem;
·
O habitáculo deve ser protegido ao
máximo contra os efeitos de Impactos laterais (dos mais perigosos);
·
O projeto deve se preocupar com a
liberação de ocupantes após impactos. Portas devem abrir (até certa deformação)
e sistemas de restrição não podem travar;
·
Os sistemas de alimentação de
combustível e elétrico não devem provocar incêndios;
·
A fixação do para-brisa deve ser
eficaz;
·
Vidros não devem provocar sérios
ferimentos cortantes;
·
Deve haver sistemas de restrição de
ocupantes eficazes: cintos de segurança. É preciso que todos os ocupantes usem
cintos, em todos os bancos;
·
Air bags frontais e laterais ajudam a
absorver impactos. Seu uso deve ser difundido ao máximo (mediante aplicação
obrigatória e/ou diminuição de custo, pelo aumento do volume de utilização);
·
A fixação dos bancos deve ser
perfeita. Eles devem ser altos o suficiente para prover apoio para a cabeça/pescoço
em impactos traseiros;
·
A “coluna de direção” não pode ser
rígida;
·
Recomenda-se sistemas de alerta em que
alguma central seja imediatamente comunicada sobre um acidente, por ocupantes do
veículo acidentado ou automaticamente. Socorro rápido é fundamental;
·
Outros.
Tem havido contínua evolução na
engenharia voltada à segurança passiva dos veículos, a qual não para nunca.
Cálculos estruturais sofisticados de carrocerias, avanços na engenharia de
materiais, desenvolvimento dos sistemas de restrição e em outros sistemas
veiculares tornam veículos mais modernos via de regra mais seguros do que os
mais antigos. Os engenheiros se valem também de resultados de “crash tests” e análise
de acidentes reais a fim de retroalimentar seus projetos.
Nas décadas entre 40 e 60 as pessoas
pensavam que seguros eram os enormes carrões com chapas de dois milímetros de
espessura, pesando três toneladas e com carrocerias presas sobre chassis
extremamente rígidos. Que engano... As carrocerias “monobloco” permitiram maior
liberdade de projeto, levando aos carros com carrocerias estudadamente
deformáveis e o tempo comprovou que estas são realmente mais seguras. Mas tudo tem um limite. O conceito
tradicional carroceria-sobre-chassis se mantém, principalmente em veículos mais
pesados. Ele é obrigatório em caminhões, muito usado em ônibus e ainda
sobrevive em pick-ups e utilitários. Nos
choques envolvendo veículos com grande diferença de peso e rigidez é evidente
que os pequenos saem perdendo. É a mesma analogia que já citei de uma luta de Box entre um
peso pesado e um peso mosca, não há como este último ganhar.
Por melhor que seja a segurança
passiva de seu carro jamais dirija em alta velocidade e tenha cuidado redobrado
em estradas de pista única, com grande trafego de caminhões. Ultrapassagens
proibidas seguidas de choques frontais são acidentes comuns e dos mais mortais.
E quanto aos atropelamentos? Na verdade
pouco se pode fazer, a não ser evitá-los. E ainda tem gente que coloca aquelas enormes
barras de aço quebra-mato na frente de carros que dirigem em cidades...
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