quinta-feira, 16 de maio de 2013


Veículos mortais 3 – Segurança Passiva

Para terminar essa breve e incompleta análise sobre segurança veicular explico alguns conceitos da “segurança passiva”, características que fazem veículos menos perigosos quando acidentes acontecem.  Os especialistas costumam dividir a segurança passiva em duas categorias, interna e externa (não confundir com fatores internos e externos de acidentes), sendo a primeira composta pelas características que protegem ocupantes de veículos acidentados e a segunda, características que protegem acidentados externos, como pedestres, ciclistas e outros.

Segurança passiva interna é uma ideia relativamente nova e segurança passiva externa mais nova ainda.

Qual é o veículo mais mortal? Sem dúvida é a motocicleta. Não precisa ser uma supermoto, basta atingir velocidades de 60 a 80 quilômetros por hora. Nada protege os ocupantes, a não ser um capacete e eventualmente roupas especiais que pouco podem fazer em acidentes em velocidades mais altas.  Motos, mesmo as de baixa cilindrada, são veículos ágeis e velozes, em função da alta relação potência/peso. Sua história se confunde com a dos automóveis (e veículos mais pesados) e desde os primórdios do século XX ambos vêm ocupando as mesmas vias, nas mesmas condições. A luta é desigual, mas historicamente esse fato foi assimilado culturalmente como sendo “normal”.

A inexistência de características de segurança passiva em motocicletas pode ser agravada, como o é no Brasil por legislação permissiva (por exemplo, a que não proíbe a circulação em “corredores” entre filas de veículos* de quatro ou mais rodas) e pela ausência de fiscalização de infrações de percurso, como excesso de velocidade, dirigir “costurando”, não obedecer a sinalização de trânsito, avançar sinais vermelhos, não respeitar faixas de pedestres, e outras.  Assim, motos são campeãs no Brasil em problemas de segurança passiva tanto interna quanto externa.  É importante aqui frisar que a proibição do tráfego ‘”no corredor” estava prevista na proposta original do CTB, tendo sido vetada em função das seguintes ALEGAÇÕES:
* “Razões do veto: “Ao proibir o condutor de motocicletas e motonetas a passagem entre veículos de filas adjacentes, o dispositivo restringe sobre maneira a utilização desse tipo de veículo que, em todo o mundo, é largamente utilizado como forma de garantir maior agilidade de deslocamento. Ademais, a segurança dos motoristas está, em maior escala, relacionada aos quesitos de velocidade, de prudência e de utilização dos equipamentos de segurança obrigatórios, os quais encontram no Código limitações e padrões rígidos para todos os tipos de veículos motorizados.”

Esse veto foi ativado por fortes “lobbies”. O trecho sublinhado acima é falso, em países adiantados motocicletas devem obedecer as mesmas regras de circulação aplicáveis aos outros veículos; é proibida a passagem em corredores ou pela direita entre veículos e calçadas ou acostamentos. Quanto aos “demais quesitos de velocidade e prudência”, sabemos que não há fiscalização a respeito, a qual, embora não sendo de implantação simples não é, por outro lado, impossível. “Equipamentos de segurança obrigatórios” pouco protegem na maioria dos acidentes, o air bag do motociclista é ele mesmo. Os resultados dessa legislação e da (não) prática de fiscalização tem sido catastróficos, como todos sabem, e vêm piorando a cada dia. Pior é o fato de que essa prática estar consolidada como “direito adquirido” na mente de muitos, tornando quase impossível ser alterada no futuro. O Brasil se acostumou com as mortes em volumes de campos de extermínio de ocupantes de motocicletas.

Agora vamos à segurança passiva em automóveis. Nos últimos 50 anos os projetos evoluíram no sentido de:

·         Preservar uma “célula de segurança”, que é o habitáculo do veículo. A cabine dever ser resistente, pouco deformável, isenta o mais possível de áreas de impacto perigosas e não invasiva por elementos externos a ela;

·         O restante da carroceria deve ser projetado para ser deformável controladamente em impactos frontais e traseiros. A deformação controlada absorve em grande parte a energia cinética que, em caso contrário, seria sentida plenamente pelos ocupantes do veiculo;

·         O teto não deve “afundar” em caso de capotagem;

·         O habitáculo deve ser protegido ao máximo contra os efeitos de Impactos laterais (dos mais perigosos);

·         O projeto deve se preocupar com a liberação de ocupantes após impactos. Portas devem abrir (até certa deformação) e sistemas de restrição não podem travar;

·         Os sistemas de alimentação de combustível e elétrico não devem provocar incêndios;

·         A fixação do para-brisa deve ser eficaz;

·         Vidros não devem provocar sérios ferimentos cortantes;

·         Deve haver sistemas de restrição de ocupantes eficazes: cintos de segurança. É preciso que todos os ocupantes usem cintos, em todos os bancos;

·         Air bags frontais e laterais ajudam a absorver impactos. Seu uso deve ser difundido ao máximo (mediante aplicação obrigatória e/ou diminuição de custo, pelo aumento do volume de utilização);

·         A fixação dos bancos deve ser perfeita. Eles devem ser altos o suficiente para prover apoio para a cabeça/pescoço em impactos traseiros;

·         A “coluna de direção” não pode ser rígida;

·         Recomenda-se sistemas de alerta em que alguma central seja imediatamente comunicada sobre um acidente, por ocupantes do veículo acidentado ou automaticamente. Socorro rápido é fundamental;

·         Outros.

Tem havido contínua evolução na engenharia voltada à segurança passiva dos veículos, a qual não para nunca. Cálculos estruturais sofisticados de carrocerias, avanços na engenharia de materiais, desenvolvimento dos sistemas de restrição e em outros sistemas veiculares tornam veículos mais modernos via de regra mais seguros do que os mais antigos. Os engenheiros se valem também de resultados de “crash tests” e análise de acidentes reais a fim de retroalimentar seus projetos.

Nas décadas entre 40 e 60 as pessoas pensavam que seguros eram os enormes carrões com chapas de dois milímetros de espessura, pesando três toneladas e com carrocerias presas sobre chassis extremamente rígidos. Que engano... As carrocerias “monobloco” permitiram maior liberdade de projeto, levando aos carros com carrocerias estudadamente deformáveis e o tempo comprovou que estas são realmente mais seguras.  Mas tudo tem um limite. O conceito tradicional carroceria-sobre-chassis se mantém, principalmente em veículos mais pesados. Ele é obrigatório em caminhões, muito usado em ônibus e ainda sobrevive em pick-ups e utilitários.  Nos choques envolvendo veículos com grande diferença de peso e rigidez é evidente que os pequenos saem perdendo. É a mesma analogia que já citei de uma luta de Box entre um peso pesado e um peso mosca, não há como este último ganhar.

Por melhor que seja a segurança passiva de seu carro jamais dirija em alta velocidade e tenha cuidado redobrado em estradas de pista única, com grande trafego de caminhões. Ultrapassagens proibidas seguidas de choques frontais são acidentes comuns e dos mais mortais.

E quanto aos atropelamentos? Na verdade pouco se pode fazer, a não ser evitá-los. E ainda tem gente que coloca aquelas enormes barras de aço quebra-mato na frente de carros que dirigem em cidades...

 
Escrito por Paulo R. Lozano em 16 de maio de 2013

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