Estatísticas (?)
Em
algum lugar escrevi que vou intercalar postagens sobre temas mais específicos a
fim de quebrar um pouco a ênfase que venho dando aos problemas sistêmicos do
trânsito brasileiro. Esta é uma delas. Posteriormente voltarei à política (ou
falta de) de trânsito.
Vou
discorrer um pouco sobre números. Começo com o obvio, autoridades adoram falar
sobre números absolutos. Vejamos notícia recente:
“As estradas federais registraram
108 mortes em decorrência de acidentes durante o feriado prolongado de Páscoa.
O número é 10% menor do que os 120 óbitos registrados no mesmo período do ano
passado. A Operação Semana Santa começou a 0h de quinta-feira (28) e terminou a
meia-noite de domingo (31). Nesses quatro dias, foram contabilizados 2.429
acidentes --9% menos que os 2.674 registrados em 2012-- e 1.371 pessoas
feridas, o que corresponde a uma redução de 20% diante dos 1.721 feriado do ano
passado.”
O que esses
números significam? NADA, ABSOLUTAMENTE NADA. Há anos autoridades têm vindo a
público informar que o “número de acidentes xx” no período de “yy” foi “ww” menor do que no período “zz”.
Números
absolutos não têm o menor valor estatístico. Quem os apresenta sabendo disso
quer enganar e quem os engole... Bem, considerando que somente 10% dos alunos
do ensino médio têm conhecimentos “básicos” de matemática não posso culpar o
povo, mas a mídia poderia ser mais inquisitiva. Repassar “press releases” é
algo que meu neto de seis anos consegue fazer.
A informação
acima se refere às estradas federais. Quem compila os dados é a Polícia
Rodoviária Federal (PRF). Quem os divulga em sites oficiais é o DNIT, do
Ministério dos Transportes. Vamos então ver algumas estatísticas da PRF sobre
as grandes “melhoras” na segurança, que as autoridades alardeiam. Devo dizer
que a menos de grande atraso em compilações anuais, até que as estatísticas da
PRF são razoavelmente explícitas. Começo com o número absoluto de acidentes nas
estradas federais:
O DNIT informa
que em 2005 administrava 53.870 quilômetros de estradas asfaltadas simples e 3.491
duplicadas e que em 2010 administrava 56.485 km de estradas simples e 4.519
duplicadas.
Não custa
ver os números absolutos:ANO ACIDENTES C/MORTE C/FERIDO
2011 188.925 7.008 63.980
2010 182.900 7.073 62.067
2009 158.893 5.976 55.013
2008 141.072 5.625 49.654
2007 128.456 5.756 46.795
2006 110.391 4.974 39.491
2005 110.086 5.003 36.999
Qualquer
estatístico vendo o gráfico acima diria que “o sistema está estável”. Mas a
quantidade não está aumentando? Claro, porém ano a ano a frota de veículos em
circulação aumenta e a população também. Passo então para o indicador UNIVERSAL
RELATIVO (consta em várias postagens anteriores) de trânsito, acidentes,
mortes, feridos, etc., por cem mil habitantes.
Ah, agora sim, aí está a “grande melhora”.
Mas alguém
pode alegar que este índice é cruel, pois no Brasil a frota de veículos vem
aumentando mais rapidamente do que a população. É verdade, mas... O índice
global de comparação é esse! Todavia, podemos usar outro índice, comparando as
quantidades absolutas com a frota em circulação, número de mortos e feridos por 100.000 veículos. Primeiro as mortes:
E agora os
feridos, considerando que o índice de gravidade é alto:
A tendência
negativa é mais nítida.
Comparando
com países civilizados esses índices são indecentes. Em contraste, nossas
autoridades varrem a sujeira para baixo do tapete e procuram de todas as formas
mostrar números absolutos aparentemente favoráveis. Como disse o Marechal
Bismark, números são como baionetas, pode-se fazer tudo com eles, menos se
sentar em cima.
Escrito
por Paulo R. Lozano em 02 de abril 2013
Nota: a base utilizada para a frota de veículos é a
fornecida pelo DENATRAN. Como nessa postagem o tema é “estradas federais”
utilizei a frota total de veículos de quatro rodas mais os comerciais, pois a maior
parte dos acidentes com motonetas e motocicletas está concentrada nas zonas
urbanas e as frotas desses veículos vêm crescendo desproporcionalmente.
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