Semáforos caros
Esta é uma postagem sobre tema específico.
Com as águas de março neste verão de 2013 fui
novamente convidado por redes de televisão a participar de reportagens externas
sobre o velho problema de semáforos inoperantes após a ocorrência de
tempestades na cidade de São Paulo. Com certeza esse é um problema nacional,
São Paulo não tem nenhuma primazia em ser suscetível a fortes tempestades. “Por
que tantos semáforos se apagam ou entram no amarelo piscante?” “Por que eles
permanecem nesse estado por tanto tempo?” “Os semáforos atendem as necessidades
da cidade?” “São modernos ou antigos?” “Além dos transtornos causados no
trânsito, a segurança fica comprometida?” E outras.
Como nada muda de ano para ano,
evidentemente as respostas são as mesmas dadas em anos anteriores. Há duas
origens para os problemas, o sistema de alimentação de energia elétrica e os sistemas
semafóricos em si.
Nas grandes e importantes
metrópoles do mundo, há muito tempo, a prática urbanística vem sendo evitar a
todo custo a distribuição aérea de energia, o que significa, claro, o enterramento
não só de fios elétricos (no mínimo de média e baixa tensão), como também de
todos os tipos de cabeamentos que as tecnologias modernas requerem. Nessas
cidades esse processo [o enterramento] é natural e, via de regra, fica por
conta das empresas de desenvolvimento urbano e prestadoras de serviços que usam
cabos. "Grandes construções? Novos loteamentos e construção de prédios e casas?
Expansão de serviços? Façam tudo enterrado por conta própria, depois repassem os
custos para os compradores e consumidores". É claro que existem leis, normas e
padrões muito bem definidos para tanto.
Em pleno século 21 essas culturas
ainda não se disseminaram no Brasil, então continuamos com a distribuição
aérea, altamente sensível aos caprichos da natureza e do homem. Os postes
evoluíram de madeira para concreto e só. Onde se via poucos fios elétricos e um
telefônico, hoje há uma parafernália horrorosa de fios, cabos e outros
dispositivos. Tamanha poluição visual era privilégio de postes cheios de gatos em
entradas de favelas. Ah, e além disso os postes ainda servem de suporte para placas
de trânsito.
As regiões mais bem arborizadas
são mais problemáticas, mas podem-se culpar as árvores? Pelo contrário, grandes
cidades precisam de mais e mais arborização, a fim de mitigar o problema da
mancha quente (hot spot) causada pela concentração de concreto e asfalto, que
potencializa a quantidade e intensidade das tempestades.
Então, parte do problema está na
falta de capacidade das concessionárias de distribuição em resolver prontamente
os problemas de falta de energia que, diga-se de passagem, ocorrem com certa frequência
também em dias normais. Por outro lado me perguntam: não há semáforos “no-break”?
Claro que sim, existem centenas de
fabricantes no mundo anunciando esses produtos. Em vários países há
normatização para esses dispositivos. Mas essa solução não vem sem
consequências colaterais. Mesmo em semáforos providos de lâmpadas LED, as
baterias têm duração limitada. Há também semáforos que funcionam sempre com
baterias, a energia da linha é usada para manter a carga. Porém os custos de
instalação desses dispositivos são altos e os de manutenção idem. Muitas
cidades têm tido problemas com roubos de baterias (se no Brasil roubam fios
elétricos, imaginem preciosas baterias). Mesmo assim creio que é uma solução importante.
Outro problema decorrente das
fiações aéreas são maiores frequências de picos de tensão, que ocorrem quando
raios atingem a rede elétrica elevada (e não faltam raios no Brasil), às vezes
longe dos locais das consequências. Existem outras causas para picos de tensão,
como curtocircuitos que ocorrem em tempestades. Os mesmos picos de tensão que
queimam televisões e eletrodomésticos em sua casa torram dispositivos eletroeletrônicos
que controlam semáforos.
Em muitos casos, havendo energia,
esses semáforos entram em amarelo piscante. E alguns permanecem nessa condição por
dias e até semanas. Por quê? Invariavelmente porque não há dispositivos reserva
em estoque para reposição nos departamento de manutenção.
Há soluções técnicas? Sim, em
geral potentes filtros de linha e / ou “redundância”, dispositivos paralelos
que entram em operação automaticamente quando o titular falha. Do lado dos problemas,
repete-se a questão dos custos de aquisição, instalação e manutenção.
Novamente, são recomendados, pelo menos, para cruzamentos importantes para o
tráfego e a segurança. Mas se não forem alocados recursos adequados – humanos e
materiais – para manutenção nos departamentos de trânsito, a emenda pode sair
pior do que o soneto.
Com certeza, a esmagadora maioria
dos semáforos que operam no Brasil é do tipo eletromecânico, projetados nas
décadas de 40 ou 50. Podem, com dificuldade e custo alto, receber “upgrades”,
para que consigam trabalhar sincronizados em pequenas redes locais e, mais
raramente, por controle remoto. Mas no século 21 o correto é que sejam
substituídos, como o foram os lampiões de gás. Apesar dos custos citados é
indubitável que São Paulo merece e precisa desses sistemas chamados “state of
the art”. O que não é admissível é que depois de instalados os benefícios se
percam por incúrias administrativas. É preciso também que a rede semafórica seja consideravelmente
ampliada.
Há uns vinte anos se fala muito
nos países desenvolvidos numa sigla ainda quase desconhecida em nosso país: ITS
(Inteligent Transportation Systems), Sistemas de Transporte Inteligentes.
Congressos regionais e mundiais, milhares de novas indústrias, especialistas,
hardware, software, há toda uma nova cultura pululando no exterior (China e
Índia investem bastante em ITS) em torno dos ITS. Pequena parte nos ITS, novos
sistemas de operação de trânsito, onde semáforos são apenas elementos do todo,
estão sendo continuamente aperfeiçoados e aplicados nos países desenvolvidos.
No Brasil e em sua maior cidade ainda engatinhamos.
Um exemplo. No fim dos anos 90 a
cidade de New York aprovou um projeto (importante não misturar provisões
para investimento com custos de manutenção) para trocar todos os 12.300
semáforos eletromecânicos em operação. Depois de criteriosos estudos puramente técnicos,
decidiu-se utilizar um sistema denominado ASTC – Advanced Solid-state Traffic
Signal Controller, desenhado especialmente para tráfego urbano pesado. O
sistema de comunicação com as Centrais de Controle escolhido é o “wireless” com
redundância, evidentemente sem cabos, similar ao dos telefones celulares. Como
melhoria à segurança decidiu-se adicional faróis Walk/Don't Walk para pedestres em
todos os semáforos. O projeto está concluído.
O custo total orçado, semáforos e
comunicação, era de 120 milhões de dólares ou 9,8 mil dólares por cruzamento. Houve
um “overrun” em torno de 10%.
Nos últimos dias a nova gestão da
prefeitura de São Paulo anunciou um programa similar a esse de New York. Se estudos
técnicos comparativos foram feitos, eles não foram amplamente divulgados. Creio
que ainda não, pois acabei de ouvir entrevista numa radio com o novo Secretario
de Transportes, Senhor Gilmar Tatto, o qual informou que esteve pessoalmente
em Londres a fim de se inteirar sobre o sistema semafórico dessa cidade. Por
que o “pessoalmente” está sublinhado? Bem, em empresas privadas estudos técnicos
são realizados pelo pessoal técnico e depois apresentados à alta administração;
sem mais comentários quanto esse fato.
Apesar de, aparentemente, ainda não
existirem estudos detalhados, o próprio prefeito, senhor Fernando Haddad, prestou
declarações amplamente divulgadas a respeito dos valores envolvidos. São,
segundo ele, necessários 500 milhões de Reais, dos quais metade ou 250 milhões para
“restaurar” a infraestrutura existente (o que não resolve o problema dos
apagões). Considerando que a cidade possui cerca de 6.200 cruzamentos com
semáforos, o custo por cruzamento será de 81 mil Reais, ou, aproximadamente, 40
mil dólares, ou quatro vezes o valor gasto por New York. O que pode justificar
essa diferença? Espero que a prefeitura explique.
Escrito por Paulo R. Lozano em 05
de abril de 2013
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